É do conhecimento comum a dificuldade que o setor comercial da economia, tanto varejistas quanto atacadistas, possui para girar seu capital dentro do ciclo mensal, podendo assim quitar seus custos fixos, renovar estoque e arcar com despesas eventuais, sem comprometer sua própria saúde financeira.
Poucas são as opções que um mercado finito como o piauiense pode oferecer aos mais diversos tipos de atividades comerciais; dentre as existentes destacam-se as instituições bancárias e as empresas de factoring. As instituições bancárias, por uma série de prerrogativas especiais não farão parte de nossas considerações, sendo que a ótica será centrada sobre a atividade de factoring.
Contrariando o que muitos equivocadamente acreditam, a atividade de factoring já é conceituada em nosso ordenamento jurídico; o que não existe ainda, é uma legislação especial que discipline suas regras de atuação, o que não impede que, por analogias a institutos já existentes e pela prática da atividade, se possa traçar panorama bem definido.
Em apertada síntese, pode-se conceituar factoring como: “O factoring é uma atividade de fomento mercantil que se destina a ajudar, sobretudo, o segmento das pequenas e médias indústrias a expandir seus ativos, aumentar suas vendas, sem fazer dívidas (...) Factoring é uma atividade complexa, cujo fundamento é a prestação de serviços, ampla e abrangente, que pressupõe sólidos conhecimentos de mercado, de gerência financeira, de matemática e de estratégia empresarial, para exercer suas funções de parceiro dos clientes. O sentido da parceria é essencial ao exercício efetivo do factoring” (LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. p 22/23)
Esta atividade possui ampla abrangência no mercado financeiro, atuando como simples parceiro comercial, até gestor de ativos frente a bolsas de valores. Para entendimento do tema ora discutido, faremos a escolha por analisar apenas a modalidade de factoring conhecida como “convencional”, ou seja, aquela em que sua atividade limita-se a adquirir títulos de vencimento futuro, a título oneroso, assumindo então a titularidade sobre seu crédito.
Algumas características são essenciais para o exercício desta atividade, quais sejam: os títulos (cheques, duplicatas, etc) sejam apresentados por um faturizado (comerciante detentor de títulos de terceiros, oriundos de negócios efetuados, cujos vencimentos se processarão adiante) ao factor (empresário da atividade de factoring); que a cessão de direitos se processe de maneira onerosa, onde o factor cobrará do faturizado uma remuneração pelo serviço; ao factor é assegurado o direito de escolha dos títulos que irá adquirir; a responsabilidade do faturizado em caso de inadimplência dos títulos é, em regra, inexistente.
Frente às características apresentadas pela atividade, é fácil a constatação de que a responsabilidade do faturizado frente à inadimplência do título, é inexistente. Essa informação é valiosa, haja vista esta não ter sido a regra prática da atividade que há muito se desenvolve em nossa capital e por todo o estado. O comum realmente tem sido a exigência, por parte dessas empresas, da responsabilidade solidária do faturizado sobre os títulos, em caso de inadimplência.
A prática acima é manifestamente equivocada, pois vai de encontro ao conceito de factoring convencional e, principalmente, afronta os já consolidados entendimentos jurisprudenciais dos tribunais superiores. Se o factor tem direito de escolha dos títulos que desejará adquirir, e cobra uma remuneração pelo seu “serviço”, assume imediatamente um ônus empresarial atinente ao risco da atividade; e tentar forçar uma responsabilidade solidária do faturizado em caso de inadimplência seria cobrar duas vezes, no mínimo, a mesma remuneração, o que é considerado ilicitude.
Existem poucos casos em que o faturizado poderá ser responsável pela inadimplência dos títulos negociados em contrato de factoring junto ao factor, porém isso ocorrerá quando o interessado comprovar efetivamente que lhe fora repassado um título viciado em seu nascedouro e que o cedente sabia dessa realidade; ou seja, é necessária a comprovação de que houve simulação ou fraude na tentativa de lesar direito alheio.
Como se vê, o tema é abrangente e instigante, principalmente por sua ampla aplicabilidade e vinculação com as práticas corriqueiras do cotidiano comercial, porém algumas premissas podem ser definidas, principalmente que em contrato de factoring, é ilícita cláusula que tente obrigar ao faturizado tornar-se devedor solidário em caso da inadimplência dos títulos negociados, com raríssimas exceções.
Waldemar M. C. de Meneses Fernandes
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